O jantar estava prestes a acabar. A sala cheia de clientes engravatados que intercalavam o manejo silencioso dos talheres com risadas efusivas.
No fundo da sala, mesmo no cantinho, eles dois sentados um em frente ao outro. O ambiente entre eles tinha chegado àquele ponto em que a ausência de palavras incomodava mais do que uma enxurrada delas sem sentido.
Como que para quebrar o constrangimento do momento e enquanto penteava, com os dedos milimetricamente afastados, o cabelo grisalho reflectido na janela atrás dela, Cazé perguntou numa voz dengosa:
- Já escolheste a sobremesa, querida?
- Quero uma mousse de chocolate - respondeu ela olhando os anéis que lhe adornavam os dedos e pensando se ali não caberia mais um.
- Muito bem! - rematou Cazé.
Pediu a mousse e um café ao empregado, olhou-a nos olhos e voltou a pousar a mão sobre a dela. De vez em quando, mexia o indicador e o polegar em jeito de festa. O movimento dos dedos era acompanhado por uma espreitadela ao vidro da janela, onde confirmava se a expressão do seu olhar coincidia com a intensidade das suas acções e palavras.
Ela contemplava-o como a uma obra de arte. Tinha de usar a imaginação para ver o que Cazé fingia esconder debaixo da roupa, mas que trabalhava arduamente todos os dias no ginásio.
Ele adorava o efeito que tinha sobre mulheres como ela. Sentia-se poderoso sempre que o olhavam daquela maneira; sempre que o ouviam contar detalhadamente as tarefas do dia; sempre que o deixavam notar a ânsia por um novo convite para sair. Nestes momentos, Cazé era rei e a sua presença fazia vibrar o mundo. Ó se fazia!
Acabado o café, tirou o pacote de pastilhas do bolso da camisa. Com um movimento rápido e certeiro atirou uma pastilha para dentro da boca e disse de si para si, enquanto a mascava cheio de vitalidade:
- Cazé, é hoje. Podes ter a certeza que não passa de hoje!
A história está a ficar deliciosa. Tens de a acabar, definitivamente, tens de a acabar!
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