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Mensagens

A mostrar mensagens de maio, 2015

E A Neve Fechou Os Olhinhos...

- Estás cada vez mais bonita. - disse-me em voz trémula aquele pedaço do que um dia foi a minha tia-avó. Mirrada pela fragilidade que a vem atacando faz tempo, reduzida a uma cama com colchão anti-escaras, olhei-a numa tentativa de a ver como dantes. Tenho por hábito tentar não ver a decadência nas pessoas de quem gosto. Fi-lo com o meu avô; fi-lo com a minha mãe quando esteve um farrapo atacado pelos cancros; fi-lo com o meu filho quando confinado àquela cama de Santa Maria e fi-lo agora com a "tuzinha".  - Estás cada vez mais bonita. E um punhado de ossos dentro de uma camisa de noite. E a vontade de lhes tocar e senti-la inteira. Sou pouco dada a tocar nas pessoas, mas às vezes apetece-me chegar-lhes.  Arranjo-lhe o cabelo com a desculpa de que está desalinhado. - Realmente o dinheiro faz milagres... Tratam-nos diferente quando pagamos...  Vem-me à cabeça a falta que lhe faz um pirilampo mágico na cabeceira da cama. Como o que o meu filho teve no hospi

Da Homofobia Que Não Há

Num destes dias, enquanto ouvíamos Adriana Calcanhotto, contei ao pai do J. que a mulher da Adriana tinha morrido de cancro da mama havia pouco tempo. O J., que me ouviu, perguntou: - Mulher? A Adriana Calcanhotto era casada com uma mulher? - Casada casada, não sei, mas eram namoradas há muitos anos. Para lá de uns vinte anos... - Vinte anos são muitos anos, mãe. - Se são, J. Ontem, ouvíamos de novo Adriana Calcanhotto e o J. diz-me: - A Adriana deve estar tão triste... Não deve, mãe? Eu, desatenta, pergunto: - Hã? Triste? Porquê? - Por causa da mulher dela que morreu. Elas já estavam juntas há tanto tempo... - É verdade, J., deve estar mesmo triste.

A Criança da Noite

Gostava de saber porque funciono muito melhor durante a noite do que durante o dia. Passo o dia feita zumbie  e à noite estou pronta para as curvas. Como fico acordada até tarde, no dia seguinte ando, outra vez, feita zumbie e à noite, de novo, eléctrica.  DAQUI Não me venham dizer que acordar cedo vira a rotina ao contrário, porque já tentei e não resultou, apenas me custou um pouco a fase do anoitecer, passada a barreira da meia-noite, fiquei pronta para trabalhar all night long . Ainda por cima gosto mesmo de trabalhar à noite, estou muito mais inspirada e a criatividade acompanha-me a insónia. O problema é que todo o mundo dorme e quando se levanta vou-me eu deitar.  Ó Crato, não dá para arranjar umas escolas nocturnas para os filhos das noctívagas?

#30 Músicas Que Entranham

O Meu Homem É Um Romântico!

Num rasgo de Dj, o meu homem operando o difícil sistema do Youtube apenas com um dedo no botão esquerdo do rato, diz, levantando a mão no ar e apontado para mim: - E agora, esta música é dedicada à Sophie! Carrega no play e ouve-se sair das colunas do computador: - Não deixe o mau-hálito afectar a sua boca e o seu corpo... A sorte dele foi que a seguir ao anúncio deu esta música que sossegou os meus instintos assassinos. Haja amor!

#6 Excertos De Uma Coisa Qualquer: Cazé - El Matador

O jantar estava prestes a acabar. A sala cheia de clientes engravatados que intercalavam o manejo silencioso dos talheres com risadas efusivas. No fundo da sala, mesmo no cantinho, eles dois sentados um em frente ao outro. O ambiente entre eles tinha chegado àquele ponto em que a ausência de palavras incomodava mais do que uma enxurrada delas sem sentido. Como que para quebrar o constrangimento do momento e enquanto penteava, com os dedos milimetricamente afastados, o cabelo grisalho reflectido na janela atrás dela, Cazé perguntou numa voz dengosa: - Já escolheste a sobremesa, querida? - Quero uma mousse de chocolate - respondeu ela olhando os anéis que lhe adornavam os dedos e pensando se ali não caberia mais um. - Muito bem! - rematou Cazé. Pediu a mousse e um café ao empregado, olhou-a nos olhos e voltou a pousar a mão sobre a dela. De vez em quando, mexia o indicador e o polegar em jeito de festa. O movimento dos dedos era acompanhado por uma espreitadela ao vidro da

O Bullying das Orelhas

O rapaz está traumatizado, não vai à escola, porque lhe gozaram com as orelhas na televisão. Ok, foi mau, mas o programa é péssimo, sempre gozou com as pessoas. Ou porque não cantam bem, ou porque têm voz esganiçada, ou porque lhes apetece. O programa serve para isso, senão não passavam as imagens das audições e faziam-nas antes do programa vir para o ar e usavam-nas como forma de triagem dos concorrentes, não os ridicularizando em público. O programa é mau, é insuportável, e vive de gozar com as pessoas, alimentando-se do escárnio aos concorrentes que já sabem de antemão que, ou são escolhidos, ou são gozados, ou são escolhidos e gozados e, às vezes, desrespeitados e muito mal-tratados. A culpa do miúdo ter ficado traumatizado é do programa? É, porque é uma merda. A culpa do miúdo ter ficado traumatizado é dos pais do miúdo? É, porque o deixaram concorrer a um programa de merda. O que me admira é que só agora, depois de gozarem com as orelhas de um puto, perceberem que o

Gente dos Lenços

David Cameron a falar na, pouco usual nos hospitais, Sic Notícias. Sentada por baixo da televisão, uma cabeça coberta com um lenço rosa desbotado. O filho ao lado, já adulto, com o dedo a trabalhar no telemóvel. O lenço está atado para o lado do filho. Cai-lhe o resto sobre o ombro a fazer de rabo-de-cavalo de um cabelo que já não tem.  De vez em quando, olha-me que estou de frente para o David e para ela. Muitos anos de vida e agora isto. Sem cabelo e com um bicho qualquer a comer-lhe as vísceras. Ouve o Cameron sem atenção. Afinal, nem sabe quem ele é. Se estivesse de frente talvez lhe reconhecesse a cara. Agora assim...  Os pensamentos falam-lhe mais alto do que o primeiro-ministro britânico que está lá no alto sobre a sua cabeça e para quem poucos olham. Como irá correr o exame? E a cozinha deixada por arrumar... Saída à pressa de casa para esta espera... Que sentença lhe estará reservada? Observa os pés para, de seguida, cruzar o olhar no meu. Há uma compreensão silenciosa

Às Vezes a Sintonia Materializa-se Num Frasco de Nutella

Estou farta dos dias disto e daquilo. Confesso que já não tenho grande vontade de os comemorar. Além do 25 de Abril e do 1 de Maio, que me parecem agora mais emergentes do que nunca lembrar, dispenso todos os outros dias festivos. Não lhes vejo grande sentido, nem me apetece oferecer presentes só porque sim, porque somos obrigados ou porque parece mal não oferecer. Na verdade, todo o limite do "parece mal" é combustível para me apetecer fazer. Coisas de adolescente rebelde por resolver, o que é que querem? Este ano, estive mesmo para não oferecer nada à minha mãe, mas ela mostrou-se meia triste, por isso acabei por lhe comprar uma florzinha. A minha mãe queria oferecer uma flor à minha avó, sua mãe, então fomos os três à florista, eu, ela e o meu bicharoco.  No caminho, o bicharoco, que ainda é mais contracorrente do que eu, disse: - Flores? Oh, não, não têm piada nenhuma... Depois vão ter de as regar. - Não, J., estas flores não se regam, põem-se numa jarra com

Frases do Dia da Mãe

A partir de agora este blogue começa a bombar em visualizações! É que, em todos os Dias das Mães, o pessoal cai aqui de pára-quedas quando anda à procura de frases para pôr no Facebook das mães. Welcome, strangers! Podem levar esta, é um presente! Para a viagem não ter sido em vão. Feliz Dia da Mãe!