Agora que acabei com a parvoíce dos Otávios, apetece-me virar-me para coisas mais sérias como, por exemplo, a questão da violência doméstica.
Acho piada que, hoje em dia, os temas noticiados sigam uma moda. Assim como aqui nos blogues e nas redes sociais, a comunicação social entra nestas andanças de nos bombardear com o mesmo assunto enquanto lhe dura a fama e depois, quando a opinião pública fica saturada, esquece o assunto como se este nunca tivesse existido.
Noto que, de repente, tudo o que produz notícias fala da mesma coisa, ele é urgências hospitalares, jihadistas ou casais a matarem-se.
De repente, todos os hospitais têm mortes nas urgências devido a demasiado tempo de espera (pessoalmente, já passei dias quase inteiros à espera de ser atendida nas urgências e há muito tempo, não recentemente), todos os bairros têm um grupinho de jihadistas e há vários maridos a matar mulheres. Portanto, tudo coisas que anteriormente não aconteciam. Novidades fresquinhas.
Claro que o facto de não serem novidades não quer dizer que não se fale neles, mas o bombardeamento com o mesmo assunto, como se acontecesse só a partir do momento em que o mundo olhou para ele e de forma tão intensiva que o torna tão corriqueiro quanto cansativo, faz-me impressão, porque lhe tira a seriedade que lhe é devida.
O caso das urgências é flagrante.
É verdade que o presente ministro da saúde tem conseguido estragar na perfeição os nossos hospitais em geral e o SNS em particular. Em matéria de estragar o senhor é exímio. Temos que lhe dar o devido crédito. Mas dar as notícias das mortes nas urgências como se antes não acontecessem parece-me um bocado forçado e de um jornalismo feito em cima do joelho e, a modos que, "popularucho".
Como disse no princípio deste texto, queria falar de violência doméstica e vou fazer um esforço para não fugir ao assunto. Prometo.
Infelizmente, a violência doméstica é uma prática ancestral. Todos estamos familiarizados com a imagem do homem das cavernas a puxar a mulher pelos cabelos. Por mais estranho que possa parecer, ainda há quem ache normal um homem dar uns tabefes à mulher quando ela se porta mal. Assim como se ele fosse uma espécie de educador daquele ser considerado inferior e assim como se alguém tivesse o supremo saber para avaliar o comportamento do outro e puni-lo por esse mesmo comportamento.
Não acredito nisto como argumento para se castigarem as crianças, acredito ainda menos quando aplicado a adultos.
O problema maior aqui, se é que há problema maior do que o de agredir quem é suposto amar-se, é que às vezes a punição já nem sequer é suportada por qualquer argumento. Chega-se ao ponto de se punir o outro por tudo e por nada. Chega-se ao ponto em que o que interessa é punir, mesmo sem se ter o cuidado de tentar justificar o acto ao outro ou, e especialmente, a si próprio. A intenção passa a ser exercer a supremacia de um ser sobre o outro. Tudo o que a civilização nos ensinou é aqui esquecido, volta-se instantaneamente aos homens das cavernas e às mulheres arrastadas pelos cabelos. Volta-se tão atrás que o caminho de regresso à sanidade mental transforma-se num percurso extremamente difícil porque ficou muito acidentado.
Não é preciso ir mais longe do que aqui abaixo ao continente nosso vizinho ou à pequena aldeia nos recônditos deste país, ou até mesmo ali à capital, onde um tal de um antigo ministro agrediu publicamente uma tal apresentadora de televisão para nos depararmos com esta modalidade ancestral. As chapadas do ex-ministro não sabemos (ou eu não sei) se foram públicas, mas as declarações à comunicação social e os comentários no perfil da agredida numa tal rede social mais públicos não podiam ter sido.
Apetece-me olhar para este caso como exemplo de todos os outros em que um homem maltrata uma mulher. Porque é um padrão. As chapadas, a chantagem psicológica que usa os filhos do casal como arma de arremesso, a difamação, as injúrias.
Quando um homem maltrata a mulher age quase sempre da mesma forma. Por isso há sinais a que se deve estar atento. Há pequenas violências que não se devem ignorar, mas assinalar e fazer parar antes que cresçam, ou volta-se, rapidamente, ao tempo dos homens das cavernas.
Mas a violência doméstica não é exclusiva dos homens. Ah pois não. Há mulheres que violentam os seus parceiros durante toda uma vida. Só que a violência das mulheres normalmente não deixa marcas físicas que se possam mostrar. A violência das mulheres geralmente é psicológica e aparece muito em forma de manipulação do outro. Ok, não abre feridas na pele. Mas escortinha a alma. As mulheres geralmente não usam a força física para maltratar os homens, até porque esta é menor do que a deles, mas usam a força psicológica que normalmente é maior, porque as mulheres ao longo da evolução da espécie foram obrigadas a sofrer mais e em silêncio e foram-se habituando a conviver com algum sofrimento e até calejando o âmago. Ainda há quem ache que mulher que é mulher deve sofrer sem proferir um ai, deve engolir ofensas, deve esconder o que lhe dói. Ainda há quem ache que a mulher deve servir o homem, preparar-lhe as refeições, tratar-lhe da roupa, levar-lhe os chinelos e baixar-lhe a cabeça. Há quem ache que a mulher deve servir e o homem ser servido.
E é por ainda haver quem ache tanta coisa que se achava no tempo dos homens das cavernas, como os homens e as mulheres terem papéis rígidos nos relacionamentos, que ainda há homens e mulheres que se agridem de parte a parte, que ainda há liberdades esquecidas, que ainda há o desejo de controlar o outro como se este lhe pertencesse.
É por isto, e por não se verem dentro das relações de igual para igual, que mulheres manipulam homens durante uma vida inteira e que homens lhes batem até à morte.
E é por ainda não se ter conseguido mudar a mente das gentes, que há quem more com a violência dentro das quatro paredes e a deixe corroer-lhe o amor até que este faleça.
Noto que, de repente, tudo o que produz notícias fala da mesma coisa, ele é urgências hospitalares, jihadistas ou casais a matarem-se.
De repente, todos os hospitais têm mortes nas urgências devido a demasiado tempo de espera (pessoalmente, já passei dias quase inteiros à espera de ser atendida nas urgências e há muito tempo, não recentemente), todos os bairros têm um grupinho de jihadistas e há vários maridos a matar mulheres. Portanto, tudo coisas que anteriormente não aconteciam. Novidades fresquinhas.
Claro que o facto de não serem novidades não quer dizer que não se fale neles, mas o bombardeamento com o mesmo assunto, como se acontecesse só a partir do momento em que o mundo olhou para ele e de forma tão intensiva que o torna tão corriqueiro quanto cansativo, faz-me impressão, porque lhe tira a seriedade que lhe é devida.
O caso das urgências é flagrante.
É verdade que o presente ministro da saúde tem conseguido estragar na perfeição os nossos hospitais em geral e o SNS em particular. Em matéria de estragar o senhor é exímio. Temos que lhe dar o devido crédito. Mas dar as notícias das mortes nas urgências como se antes não acontecessem parece-me um bocado forçado e de um jornalismo feito em cima do joelho e, a modos que, "popularucho".
Como disse no princípio deste texto, queria falar de violência doméstica e vou fazer um esforço para não fugir ao assunto. Prometo.
DAQUI |
Não acredito nisto como argumento para se castigarem as crianças, acredito ainda menos quando aplicado a adultos.
O problema maior aqui, se é que há problema maior do que o de agredir quem é suposto amar-se, é que às vezes a punição já nem sequer é suportada por qualquer argumento. Chega-se ao ponto de se punir o outro por tudo e por nada. Chega-se ao ponto em que o que interessa é punir, mesmo sem se ter o cuidado de tentar justificar o acto ao outro ou, e especialmente, a si próprio. A intenção passa a ser exercer a supremacia de um ser sobre o outro. Tudo o que a civilização nos ensinou é aqui esquecido, volta-se instantaneamente aos homens das cavernas e às mulheres arrastadas pelos cabelos. Volta-se tão atrás que o caminho de regresso à sanidade mental transforma-se num percurso extremamente difícil porque ficou muito acidentado.
Não é preciso ir mais longe do que aqui abaixo ao continente nosso vizinho ou à pequena aldeia nos recônditos deste país, ou até mesmo ali à capital, onde um tal de um antigo ministro agrediu publicamente uma tal apresentadora de televisão para nos depararmos com esta modalidade ancestral. As chapadas do ex-ministro não sabemos (ou eu não sei) se foram públicas, mas as declarações à comunicação social e os comentários no perfil da agredida numa tal rede social mais públicos não podiam ter sido.
Apetece-me olhar para este caso como exemplo de todos os outros em que um homem maltrata uma mulher. Porque é um padrão. As chapadas, a chantagem psicológica que usa os filhos do casal como arma de arremesso, a difamação, as injúrias.
Quando um homem maltrata a mulher age quase sempre da mesma forma. Por isso há sinais a que se deve estar atento. Há pequenas violências que não se devem ignorar, mas assinalar e fazer parar antes que cresçam, ou volta-se, rapidamente, ao tempo dos homens das cavernas.
DAQUI |
E é por ainda haver quem ache tanta coisa que se achava no tempo dos homens das cavernas, como os homens e as mulheres terem papéis rígidos nos relacionamentos, que ainda há homens e mulheres que se agridem de parte a parte, que ainda há liberdades esquecidas, que ainda há o desejo de controlar o outro como se este lhe pertencesse.
É por isto, e por não se verem dentro das relações de igual para igual, que mulheres manipulam homens durante uma vida inteira e que homens lhes batem até à morte.
E é por ainda não se ter conseguido mudar a mente das gentes, que há quem more com a violência dentro das quatro paredes e a deixe corroer-lhe o amor até que este faleça.
DAQUI |
Certeira.
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