Hoje, fui às compras. Estavam lá as brigadas do Banco Alimentar Contra a Fome.
Fiz as minhas compras e quando estava na caixa para as pagar, oiço uma das senhoras, que distribuía os sacos de plástico do Banco Alimentar, falar com um homem, negro que vestia calças de ganga e uma daquelas t-shirts dos clubes de futebol, que se desculpava por não aceitar o saco que ela lhe estendia.
(A descrição do homem serve apenas para conseguirem visualizar o perfil que a senhora desenhou do seu interlocutor).
A dita senhora respondeu assim às desculpas dele:
(A descrição do homem serve apenas para conseguirem visualizar o perfil que a senhora desenhou do seu interlocutor).
A dita senhora respondeu assim às desculpas dele:
- Sim, compreendo, também é pobrezinho, não é?
Há anos que não ouvia este "pobrezinho", que tem vindo a ser substituído por "carenciado". Confesso que o "pobrezinho" me caiu mal, não por eu preferir o "carenciado", mas por o "pobrezinho" me cheirar sempre a caridadezinha.
Fiquei a matutar na real motivação das pessoas que contribuem nestas iniciativas (das voluntárias e de quem, como eu, faz compras para o Banco Alimentar). Será esta uma acção solidária ou um gesto de caridadezinha?
À partida, pode parecer-vos que não tem grande importância tratar-se de uma ou de outra, desde que as pessoas ajudem quem precisa. A mim, que sou uma eterna céptica e que tenho esta estranha mania de questionar tudo e mais alguma coisa, parece-me que faz toda a diferença. Vejo a caridade(zinha) como uma atitude egoísta e de desprezo pelos outros, na medida em que quem a pratica está centrado em si próprio e apenas preocupado em parecer bondoso e em garantir o seu lugar de 5 estrelas no Céu. Enquanto quem é solidário preocupa-se realmente com o outro e coloca-se ao seu lado com a verdadeira intenção de o ajudar.
Esta "onda de solidariedade", como lhe chama a comunicação social perante o número de toneladas de alimentos recolhidos, não pode ser apenas uma "onda de caridadezinha"?
Eu inclino-me mais para o lado da segunda opção, até porque se a relacionarmos com as batalhas campais instaladas nos supermercados Pingo Doce no primeiro dia deste mês, verificamos que só faltou as pessoas comerem-se umas às outras para obterem aquele pacote de arroz que ficou esquecido na prateleira.
O egocentrismo está tão bem instalado nesta sociedade, que não consigo deixar de desconfiar quando oiço falar em solidariedade.
E, depois de ouvir sair o "pobrezinho" da boca daquela senhora, parece que tudo passou a fazer mais sentido. Na minha cabeça, juntaram-se os fios que estavam soltos, e comecei a perceber (ou a julgar perceber) porque, em tempo de crise, acorre a maior parte das pessoas a acções de voluntariado e "solidárias". Acredito que haja pessoas que o fazem por verdadeira solidariedade, mas também acredito que estas são pouquíssimas.
Por momentos, senti-me quase igual àquela senhora...
Será que eu, quando enfio umas compras dentro do saco do Banco Alimentar, estarei realmente preocupada com as pessoas que vão receber aqueles alimentos? Ou estarei simplesmente a aliviar a minha consciência, convicta que estou a fazer alguma coisa por elas?
Não gosto de me sentir caridosa, até porque não acredito em Deus ou que tenha um lugar 5 estrelas, no Céu, à minha espera.
Preferia ser solidária, porque acredito que quem é/está carenciado (ou "pobrezinho") não está assim tão longe de mim, não é menos do que eu por isso, ou tem menos direito a ter uma vida onde as suas necessidades estão satisfeitas e as oportunidades são uma panóplia de caminhos à escolha.
Mas o que eu gostava ainda mais era que não houvesse tanta necessidade de IPSS ou de voluntários, o que significaria que viveríamos numa sociedade mais equilibrada e, por isso, mais justa.
Mas isso... sou eu a sonhar, que além de céptica, também sou sonhadora.
Há anos que não ouvia este "pobrezinho", que tem vindo a ser substituído por "carenciado". Confesso que o "pobrezinho" me caiu mal, não por eu preferir o "carenciado", mas por o "pobrezinho" me cheirar sempre a caridadezinha.
Fiquei a matutar na real motivação das pessoas que contribuem nestas iniciativas (das voluntárias e de quem, como eu, faz compras para o Banco Alimentar). Será esta uma acção solidária ou um gesto de caridadezinha?
À partida, pode parecer-vos que não tem grande importância tratar-se de uma ou de outra, desde que as pessoas ajudem quem precisa. A mim, que sou uma eterna céptica e que tenho esta estranha mania de questionar tudo e mais alguma coisa, parece-me que faz toda a diferença. Vejo a caridade(zinha) como uma atitude egoísta e de desprezo pelos outros, na medida em que quem a pratica está centrado em si próprio e apenas preocupado em parecer bondoso e em garantir o seu lugar de 5 estrelas no Céu. Enquanto quem é solidário preocupa-se realmente com o outro e coloca-se ao seu lado com a verdadeira intenção de o ajudar.
Esta "onda de solidariedade", como lhe chama a comunicação social perante o número de toneladas de alimentos recolhidos, não pode ser apenas uma "onda de caridadezinha"?
Eu inclino-me mais para o lado da segunda opção, até porque se a relacionarmos com as batalhas campais instaladas nos supermercados Pingo Doce no primeiro dia deste mês, verificamos que só faltou as pessoas comerem-se umas às outras para obterem aquele pacote de arroz que ficou esquecido na prateleira.
O egocentrismo está tão bem instalado nesta sociedade, que não consigo deixar de desconfiar quando oiço falar em solidariedade.
E, depois de ouvir sair o "pobrezinho" da boca daquela senhora, parece que tudo passou a fazer mais sentido. Na minha cabeça, juntaram-se os fios que estavam soltos, e comecei a perceber (ou a julgar perceber) porque, em tempo de crise, acorre a maior parte das pessoas a acções de voluntariado e "solidárias". Acredito que haja pessoas que o fazem por verdadeira solidariedade, mas também acredito que estas são pouquíssimas.
Por momentos, senti-me quase igual àquela senhora...
Será que eu, quando enfio umas compras dentro do saco do Banco Alimentar, estarei realmente preocupada com as pessoas que vão receber aqueles alimentos? Ou estarei simplesmente a aliviar a minha consciência, convicta que estou a fazer alguma coisa por elas?
Não gosto de me sentir caridosa, até porque não acredito em Deus ou que tenha um lugar 5 estrelas, no Céu, à minha espera.
Preferia ser solidária, porque acredito que quem é/está carenciado (ou "pobrezinho") não está assim tão longe de mim, não é menos do que eu por isso, ou tem menos direito a ter uma vida onde as suas necessidades estão satisfeitas e as oportunidades são uma panóplia de caminhos à escolha.
Mas o que eu gostava ainda mais era que não houvesse tanta necessidade de IPSS ou de voluntários, o que significaria que viveríamos numa sociedade mais equilibrada e, por isso, mais justa.
Mas isso... sou eu a sonhar, que além de céptica, também sou sonhadora.
Mammy, percebo perfeitamente as tuas dúvidas e acho que a tua análise é correcta!
ResponderEliminarEste fim de semana não calhou ir ao supermercado, mas se fosse teria concerteza comprado alguns bens alimentares para o Banco Alimentar, como faço sempre desde que começaram as campanhas.
O sentimento que me percorre quando compro as coisas, mas principalmente quando entrego o saco é um nó na garganta, em algumas vezes senti lágrimas a quererem brotar, porque eu só pensava que aqueles alimentos iam para a boca de quem tem fome e não tem dinheiro para comprar comida para si e para os seus filhos.
Se isto é caridadezinha ou solidariedade não posso dizer... sei que o faço de coração, porque eu tenho dinheiro para comer e para alimentar os meus filhos, e sei que acaso não fosse assim, gostaria que houvesse alguém que fosse generoso o suficiente para ter este mesmo gesto para comigo...
Aprendi com os meus pais que posso não ter muito, mas haverá sempre alguma margem para ajudar alguém a não ter o estômago vazio! A isto eu chamo de generosidade...
Pois infelizmente pagam os justos pelos pecadores. Sei de histórias gritantes de pessoas que vivem à custa do BA sem precisarem, mas mesmo assim contribuí para que a ajuda chegue também a quem realmente precisa.
ResponderEliminarBom semana* Beijinhos**
Opa mas que raio...Pobrezinho?? Eu se tivesse ouvido isso chegava-me a mostarda ao nariz, onde já se viu...
ResponderEliminarBeijinho*
Mammyamiga
ResponderEliminarPoizé, mas é o que temos, ou seja, o que somos. Sociedade mais justa? Por cá mais justas só se forem algumas calças.
Triste sina ter nascido aqui; mas, se calhar, na Alemanha ainda seria pior, por mor da Merkel. Ora essa, também a temos por cá... Como sempre digo, em Goa éke tinha sido bom. Ver, sff, a TRAVESSA
Qjs = queijinhos = beijinhos
Quando os vejo à porta dos super mercados a primeira imagem que me vem a mente é das pessoas à procura de comida no lixo, por isso compro sempre algo. E vou ser sincera (vais dizer que sou má), desde que as pessoas continuem a comprar e a dar ao BA, a mim não me interessa qual é a verdadeira intenção delas, o que interessa é que alguém vai poder comer. Beijinhos
ResponderEliminarNaná,
ResponderEliminarEu também dou sempre qualquer coisa para o Banco Alimentar que é uma instituição pela qual tenho grande consideração (até que me provem que não a devo ter), mas o que me chateia, e digo chateia porque chateia mesmo, é ver gente hipócrita armada em boazinha e cheia de falsas boas intenções. E vejo isso, imensas vezes todos os dias.
E chateia-me MUITO MAIS ver este país a desequilibrar-se socialmente a cada dia que passa, e nós, que contribuímos, porque temos alguma consciência e queremos ajudar quem precisa, acabamos por estar a ajudar esse desequilíbrio a acentuar-se, porque vamos "segurando as pontas" através da nossa ajuda, mesmo que mínima.
Art And Life,
Não digo nada que és má!
Más são as empresas, como alguns supermercados, que passaram a regar o lixo dos seus contentores com lixívia para que ninguém possa ir lá buscar os restos.
Elas deviam era dar as toneladas de pão do dia que deitam fora, todos os dias, e todos os alimentos que, não estando já tão frescos ainda estão perfeitamente consumíveis, a instituições.
Más são Mcdonalds, e outras que tais, que deitam fora imensa comida diariamente.
Se toda essa comida desperdiçada fosse aproveitada, não seriam precisas tantas campanhas do Banco Alimentar.
Se não houvesse tantas mega-empresas cheias de dinheiro, ele estaria melhor distribuído e haveria menos gente a passar fome.
Mas isso, não interessa aos governos. Para eles é sempre mais interessante o dinheiro estar nas mãos de quem lhes pode dar algum.
Bjs
Estou totalmente de acordo. Isso é mesmo triste, como são as pessoas tão mesquinhas :(
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