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A Ida

Sei que vou ser a primeira a partir, não estou preocupada, porque sei que eles se vão aguentar bem sem mim e porque prefiro ser eu a ir do que eles. Sem falsas modéstias ou falso altruísmo, prefiro ser eu a ir primeiro, sou a mais velha e a que já estou preparada. Já fiz o meu estágio com a morte, já a vi de perto... 
Sei que vão sentir falta, que vão sofrer, mas sei que vão acabar por conseguirem ser felizes. Eles têm uma grande capacidade para serem felizes... os meus amores...

A doença foi-se por uns tempos, mas vai voltar, volta sempre. Já voltou para tanta gente, porque não irá voltar para mim? Talvez não apareça no mesmo sítio, talvez apanhe os médicos desprevenidos, mas a mim não me apanha desprevenida, porque sei que ela vai voltar...
Já levou tanta gente, esta maldita doença... Gente jovem e aparentemente saudável, gente de valor, gente grande de alma e coração. Porque me deixaria a mim aqui?
Tenho medo, claro que tenho medo, tenho medo de não ver o meu filho adolescente, de não o ver adulto, de não conhecer os meus netos... Mas não estou desprevenida, apenas finjo que não estou atenta, apenas finjo que não sei que ela anda por aí a espreitar-me. Por eles, por mim, pelos objectivos que tenho que arranjar para continuar a viver feliz.
Sim, sou feliz, apesar da espada que balança sobre a minha cabeça, sou feliz. 
Bem feito para ela que não me consegue fazer infeliz, que não consegue que eu deixe de gostar de viver e me entregue a uma qualquer depressão. 
Vivo e continuarei a viver cada dia com a mesma intensidade, mesmo no dia em que ela voltar e me levar partes do corpo ou me tirar todos os cabelos e me queimar os órgãos.

Podes tirar-me a saúde... Mas nunca... estás a ouvir, sua filha da mãe? Nunca me vais tirar a felicidade de viver! Só mesmo quando me conseguires matar... 
Até lá, vais ter que levar com a minha felicidade, sua parvalhona!

Comentários

  1. fazes muito bem em ter essa filosofia de vida, pois só assim sabemos viver!

    a espada sobre a cabeça... todos nós temos, às vezes basta ir a atravessar a rua, por isso, não vale a pena pensar muito nos "ses".

    beijinho grande e mantém sempre essa força!

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  2. Reconheço nas tuas palavras as mesmas que a minha mãe deve ter repetido durante 3 anos, para se agarrar à vida, durante nem que fosse mais um dia, mais uma hora e mais um minuto...

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  3. Ainda bem que pensas assim, acho que é o melhor para ti e para os que estão ao teu lado, mas vou ser sincera este post deixa-me triste, faz voltar ao passado.

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  4. mais um post de arrepiar...Que bom pensares assim!Admiro a tua forma de encarar as coisas e gostava muito que todos pensassem assim!bjs

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  5. ... mas antes, muito antes, ainda hei-de ir eu!

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  6. caramba, Sofia, que partilha! Admiro-te muito, mesmo! Pela tua FORÇA, pela tua CORAGEM, pelo teu OLHAR sobre ela!
    MUITA, MAS MESMO MUITA ADMIRAÇÃO, Sofia!
    BEM-HAJAS
    um grande beijinho

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  7. Admiro-te muito, mas espero que a vida te dê ainda muitos e muitos anos pela frente. Bj**

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  8. assim é que se fala! Eu gostava de ter essa força acredita!! E espero que ela nunca mas nunca mais te volte a assombrar :)

    Beijinho*

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  9. Acho muito bem que penses assim e nunca te deixes abater, mas tem fé e esperança que essa doença maldita não te vai voltar a atacar.
    Se também muita gente consegue vencê-la definitivamente, tu também consegues, vais ver!

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  10. Olha, não sei se te referes àquilo que eu penso e espero que não, mas se for, também eu tenho muito medo de tudo o que tens medo, pelas razões por que tu tens medo. E tu não vais a lado nenhum tão cedo, ouviste? Rais'parta que agora deste-me um bac sem quereres!

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