Às vezes, fico sem palavras. Custa-me falar e o esforço para ser assertiva é enorme.
Às vezes, o esforço não vale de nada e sai-me da boca a palavra errada no tempo errado. Ou não sai nada.
Mas o que é que se diz a uma mãe que acabou de perder um filho para o cancro?
Não sei. Nunca sei.
Na infinidade de significados que as palavras podem ter não há um que expresse o pesar que traz a perda de um filho.
Se há, eu não o encontrei. E saiu-me qualquer coisa como "estas lutas..." e engoli "são inglórias" e "são uma merda". Disse-o só para mim, como digo, tantas vezes, aquilo que não me sai aos outros.
Saem-me poucas coisas aos outros. Engulo muitas palavras que queria aos outros. Engulo-as e saem-me as erradas, ou saem-me grunhidos, ou silêncios, ou nada.
Se há, eu não o encontrei. E saiu-me qualquer coisa como "estas lutas..." e engoli "são inglórias" e "são uma merda". Disse-o só para mim, como digo, tantas vezes, aquilo que não me sai aos outros.
Saem-me poucas coisas aos outros. Engulo muitas palavras que queria aos outros. Engulo-as e saem-me as erradas, ou saem-me grunhidos, ou silêncios, ou nada.
Depois veio a culpa de estar viva no velório de alguém que morreu de cancro. Esta culpa que me persegue a cada pessoa que a doença vence. Porquê eu viva e não ela? Porque é que uns morrem e outros não? Ou porque é que uns sobrevivem e outros não?
Sinto sempre que a minha presença se impõe aos que choram a ida de um ente querido com cancro, de um ente tão querido quanto o é um filho, uma esposa, um pai... Presença, esta minha, que trocariam num ápice pela do ente tão mais querido do que eu, que entregariam ao cancro sem olhar para trás. Como compreendo bem a troca. E aceito. E quase peço desculpa por não ter ido também, por estar aqui viva. E não me sai palavra. Nem a resposta a eu continuar e ao filho ter partido.
Penso, isto é tudo aleatório, para confortar a minha culpa e justificar a presença para além dos outros que se foram. Penso isto sem grandes certezas, mas, naquele momento, preciso que seja verdade.
Penso, isto é tudo aleatório, para confortar a minha culpa e justificar a presença para além dos outros que se foram. Penso isto sem grandes certezas, mas, naquele momento, preciso que seja verdade.
Tento pôr-me no lugar da mãe - mas tento pôr-me só um bocadinho no lugar mãe, porque isto de tentar imaginar a dor de perder um filho já dói tanto que é reflexo afastar a ideia - e dá-me vontade de a pegar ao colo como se pegam nos órfãos, confortá-la no meu regaço, embalá-la até que pare de soluçar e sossegar-lhe as lágrimas, e a dor.
Em vez disso, choro com ela e desmancho a seriedade e lucidez que tanto me custou construir para a enfrentar e tentar, de alguma forma, consolar. Se é que há consolo possível da dor, desta dor que deixa os pais órfãos dos filhos e que é tão intensa quanto infinita.
Em vez disso, choro com ela e desmancho a seriedade e lucidez que tanto me custou construir para a enfrentar e tentar, de alguma forma, consolar. Se é que há consolo possível da dor, desta dor que deixa os pais órfãos dos filhos e que é tão intensa quanto infinita.
:( Também não sei o que dizer nessas alturas. Talvez o melhor seja mesmo não dizer nada e estar apenas presente. E nestas coisas não me parece que exista uma justiça divina.Talvez um significado oculto, sei lá, que nos escapa à compreensão ou então é mesmo aleatório. Justiça é que não. Tu mereceste viver e essa criança também merecia, não há mais ou menos merecedores. Um beijinhos
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